segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Intuição

Hoje eu consigo interpretar esses sinais que me chegam e ainda indecifráveis, me tiram do normal. Deve haver mesmo muito mais mistérios entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia. Existem muito mais significados em alguns meros acasos do que podemos supor.

Todas as pessoas que me abalaram a alma, e foram poucas, enviaram sinais antes mesmo que eu as conhecesse. Não é absurdo, nem devaneio. Hoje falo com certeza que sendo anjos ou diabos, alguns seres se anunciam misteriosamente. Ou nem propriamente eles, mas o seu impacto. Uma espécie de energia que é emanada e só outro corpo específico recebe.

Você já parou no meio do seu dia, no olho do furacão, apenas por ouvir uma voz? Ainda sem entender esse som, algo ali pulsava? É a intuição. Impossível ler de cara, mas depois unimos as peças e montado está o quebra-cabeças etéreo. Pois é, se no turbilhão cotidiano uma voz te paralisa, deve haver muito mais do que um espírito assim nem tão evoluído como meu, possa entender. Ou não há o que entender. É contemplação. (Poucos querem saber o movimento do sol, seus graus, rotações, mas vê-lo e senti-lo preenche quase tudo em inúmeras almas)

Ouvir o nome de uma pessoa e de alguma forma sentir-se curioso, afoito, avulso por não saber quem é...já lhe ocorreu? Eu digo que há muito mais de cinema nessa vida tacanha do que admitimos normalmente. Óbvio que esses impactos não são freqüentes. Se fossem, teria outro nome. Não seria intuição. Esse chamado incômodo, misterioso, é o prenúncio de uma chegada, de uma transformação. Estaremos preparados?

Meu primeiro amor foi assim. Um menino lindo passou por mim. Poderia ser só mais um. Eu não entendi, mas incomodou profundamente e nossa relação durou mais de uma década e transformou nossas vidas para sempre. Grandes amizades também. Numa aula de sociologia, um casal me puxava o olhar. Um rapaz barbudo e uma moça diferente de todo mundo. Nesse mesmo dia passamos horas conversando e estamos na vida de cada um há mais de sete anos. Amém.

O que eu afirmo é que nosso corpo, nossos sentidos, entendem sinais antes de nossa consciência. Esse período meio REM, é o que entendo por intuição. É uma espécie de transe, letargia, dormência. Há um grito que ainda irá se propagar.

A vida é mágica e nós também. Não podemos negar ou fechar as portas para isso. Podemos mudar qualquer percurso. Mas se passarmos batido, o que terá ficado para trás?

Talvez essas relações sejam as chamadas “cármicas”. Não tenho conhecimento para falar sobre o assunto, mas respeito, porque a respeito dele, eu intuo, no meu torpor quase consciente pela busca de respostas, que ele existe e há fundamentos que pertencem ao campo sensitivo. Fogem da capacidade científica ou lógica. Estupidez é negar esse fato. ( Ou excesso de terra na carta natal, o que confere um ceticismo insuportável).

Ainda bem que já sabemos valorizar e entender a inteligência emocional. O mundo está evoluindo, eu creio.

E se há tanto para aprender e conhecer, que o máximo disso tudo seja agora. Seja lá o que de fato for, eu sou a favor do crescimento. Tenho mesmo meus braços abertos para o novo que me sorri e toca a alma. (Raro). É maravilhoso saber que há presentes guardados e amargos que nos enobrecem e transformam. Isso afinal é estar vivo e interagir. Quero minha intuição aguçada, não mais a nego. Ela me presenteia e protege. As outras coisas, depois dela, são os fatos que fogem a nosso controle ou vontade. Mas é nessa dança que a gente vira gente de verdade. Eu estou aprendendo. Um dia vou saber voar.


quinta-feira, 27 de agosto de 2009

O zelo e o falo

O homem é o falo e a mulher é o zelo.

O homem vive mais a sua liberdade desde cedo. Tudo bem mais descomplicado e centralizado em seu pênis. O pau que ganha o mundo, sem culpa e curioso, desbravando, abrindo caminhos. O falo não tem culpa. Lavou, tá novo. O zelo tem a ver com a lua, cíclico, confuso e cheio dos significados que complicam tudo.

Não é a toa que Freud afirmou que meninas invejam o pênis. A ignorância geral discutiu, discordou desse conceito. Por Deus, mulheres não querem ter um pau. Se me aparecesse um no meio das pernas, seria um elefante branco. Mulheres querem essa simplicidade, tudo pra fora, explícito, sem tanto mistério e culpas. O falo é, portanto, o poder sem tanta dor de cabeça, sem tantas revoluções internas, sem leite nas tetas e criança no ventre.

O falo é Marte, o zelo é Vênus.

O falo é o guerreiro, o instinto. O zelo é o inexplicável, o terreno fértil da emoção, a maternidade.

O zelo é intrínseco, como os ovários. Tem fases fecundas, cistos, oscilações hormonais.

O falo é óbvio, o zelo sangra. Um jorra e outro gera.

O falo faz, o zelo pondera. Um quer resolver e outro quer ser ouvido.

O falo se distrai, o zelo observa. Um quer se isolar, o outro critica.

O falo quer ser admirado, o zelo precisa ser amado.

O falo precisa da diversidade, o zelo sonha com a fidelidade.

O falo é mais raso, o zelo é complexo.

O falo é consciente, o zelo é sonho.

O falo é um carro, o Zelo um vaso. Um quer velocidade, o outro quer ser preenchido.

O falo é um grito, o zelo é diálogo.

O falo é cachorro, o zelo é gato.

O falo é uma flecha, o zelo é caminhada. Um segue em linha reta, o outro sonha com possibilidades.

Seria muito mais simples, desde sempre, ter o poder de experimentar tudo e ser legitimado pelo mundo. Eis que a fêmea queimou os sutiãs, brigou com a família, sentiu tanta culpa e seguiu rumo ao casamento e a maternidade. Como se fosse pouco, foi inserida no mercado de trabalho e sem o falo, trabalha dobrado e ás vezes chora no expediente ou se apaixona pelo cara errado.

Viva a deusa Vênus, com seus poderes infinitos, mas sê-la encarnada não é fácil.. Assim, se pesquisa e se especula o universo zeloso, do amor-cuidado, que sem dúvida é imensamente mais rico e é dele que vem a vida. Ponto.

O zelo e o falo podem ser complementares, mas é preciso que se fundam em doses saudáveis e individualmente. Essa é a problemática do mundo, que hoje ruma para a solidão dos fatos mesmo sabendo que o zelo quer sempre cobrir o falo e ele, ser amado e seduzido pelo zelo.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Pedaços

Definiste o fato

Fazendo pouco do afeto

Haviam moldes exatos

Para encaixar os seus modelos

O ímã era redondo,

Não coube na fôrma quadrada

A atração desse corpo

Forçava uma entrada

Nessa física absurda

A carne machucava

Não mudava de forma

Não encaixava

Pra acabar com essa agonia

Espatifou- se em mil pedaços

Agora não entra nada

Porque vaza do outro lado

Virou tudo

Um monte de pecinhas

Sem aparente significado

Mas quando colar tudo

Vai virar um lindo mosaico.

domingo, 23 de agosto de 2009

O peso e a leveza


Já o li inúmeras vezes mas, sempre que me deparo com alguns trechos, eles parecem tomar novo significado, como se eu não tivesse observado algumas nuances nas suas entrelinhas.

A insustentável leveza do ser é um livro complexo e ao mesmo tempo absolutamente próximo de nossos questionamentos mais profundos.

Para mim é uma obra – prima. Acho que ainda me pegarei relendo suas páginas por muitos anos da minha vida.

Um pouco sobre a obra:

O filósofo Nietzche defende o conceito do “eterno retorno”, ou seja, que todos os acontecimentos referentes a história da humanidade, e da vida de cada um, irão repetir-se diversas vezes. O autor do Romance “A insustentável leveza do ser”, Milan Kundera, confronta essa idéia, afirmando que o eterno retorno é o mais pesado de todos os fardos, e que anular por completo o fardo, torna o movimento humano tão livre que o destitui de qualquer significado.

A questão central do livro se apresenta:

Para onde ir? Em direção ao peso ou a leveza?

Por meio da dinâmica de dois casais, o autor nos mostra que todas as nossas ações são únicas, desprovidas de um sentido maior, e que nossa vida não acontece senão uma única vez.

Este é um romance sobre relacionamentos, mas que levanta questões filosóficas: será que a vida tem sentido? Ou será o niilismo defendido por Kundera a solução? Analisando o comportamento de seus personagens, ele levanta tais questões e deixa ao leitor a decisão final; afinal, ele mesmo defende que, qualquer que seja esta decisão, terá a leveza insustentável do ser.

Alguns trechos do romance:

"Tereza sabe que é mais ou menos assim o instante em que nasce o amor: a mulher não resiste a voz que chama sua alma amedrontada; o homem não resiste à mulher cuja alma se torna atenta à sua voz".

"Todos nós temos a necessidade de ser olhados. Podemos ser classificados em quatro categorias, segundo o tipo de olhar sob o qual queremos viver.
A primeira procura o olhar de um número infinito de pessoas anônimas, em outras palavras, o olhar do público (...)
Na segunda categoria estão aqueles que não podem viver sem ser o foco de numerosos olhares familiares. São os incansáveis organizadores de coquetéis e jantares, mais felizes do que os da primeira categoria, que quando perdem seu público imaginam que a luz se apagou na sala de suas vidas. É o que acontece a todos, mais dia menos dia (...)
Vem em seguida a terceira categoria, aqueles que têm necessidade de viver sob o olhar do ser amado. A situação destas pessoas é tão perigosa quanto a daquelas da primeira categoria. Basta que os olhos do ser amado se fechem para que a sala fique mergulhada na escuridão (...)
Por fim existe a quarta categoria, a mais rara, a daqueles que vivem sob o olhar imaginário dos ausentes. São os sonhadores".


“Se cada segundo de nossas vidas repete-se infinitas vezes, somos pregados à eternidade feito Jesus Cristo na cruz. É uma perspectiva aterrorizante. No mundo do eterno retorno, o peso da responsabilidade insuportável recai sobre cada movimento que fazemos. É por isso que Nietzsche chamou a idéia do eterno retorno o mais pesado dos fardos (das schwerste Gewicht).

Se o eterno retorno é o mais pesado dos fardos, então nossas vidas contrapõem-se a ele em toda a sua esplêndida leveza.

Mas será o peso de fato deplorável, e esplêndida a leveza?

O mais pesado dos fardos nos esmaga; sob seu peso, afundamos, somos pregados ao chão. E, no entanto, na poesia amorosa de todas as épocas, a mulher anseia por sucumbir ao peso do corpo do homem. O mais pesado dos fardos é, pois, simultaneamente, uma imagem da mais intensa plenitude da vida. Quanto mais pesado o fardo, mais nossas vidas se aproximam da terra, fazendo-se tanto mais reais e verdadeiras.

Inversamente, a ausência absoluta de um fardo faz com que o homem se torne mais leve do que o ar, fá-lo alçar-se às alturas, abandonar a terra e sua existência terrena, tornando-o apenas parcialmente real, seus movimentos tão livres quanto insignificantes.

O que escolheremos então? O peso ou a leveza?

Parmênides levantou essa mesma questão no sexto século antes de Cristo. Ele via o mundo dividido em pares opostos: luz/escuridão, fineza/rudeza, calor/frio, ser/não-ser. A uma metade da oposição, chamou positiva (luz, fineza, calor, ser); à outra, negativa. Nós poderíamos achar essa divisão em um pólo positivo e outro negativo infantilmente simples, não fosse por uma dificuldade: qual é o positivo, o peso ou a leveza?

Parmênides respondeu: a leveza é positiva; o peso, negativo.

Tinha ou não razão? Essa é a questão. Certo é apenas que a oposição leveza/peso é a mais misteriosa, a mais ambígua de todas.”

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Rasguei as listas

Eu ando estranhando a minha civilidade.

Ando muito paciente,

bebendo a lentos goles, coesa.

Me pego conversando sobre coisas amenas e quando me questionam sobre coisas difíceis, não gaguejo.

Estou até dormindo menos, fazendo planilhas. Antes, no máximo, eram listas. Listas aliás, absurdas, acho que eu era influenciada pela ditadura do que vc tem que fazer antes dos 30

Essas pseudo obrigatoriedades, prazos e estatísticas, me infernizavam.

De quantos caras eu gostei?

Quantas transas,

quantos foras, furos, arrependimentos, furadas?

Lugares que eu nunca visitei, museus, países, praias.

Amigas que perdi,

que abandonei,

que me deixaram marcas.

Quantas vezes eu fugi de casa querendo ser encontrada?

Se eu morresse hoje, quem choraria?

E se eu casasse, quantos convidados?

Nomes de possíveis filhos,

e se for menina?

Como decoraria seu quarto?

10 músicas para dançar,

outras 10 para cair no choro,

atitudes para impressionar,

calorias de tudo.

As profissões que eu poderia seguir,

idiomas que eu preciso aprender,

livros obrigatórios,

talheres apropriados.

Peças indispensáveis para uma temporada na praia,

no campo,

pretinhos básicos,

truques para parecer mais magra,

outros para textos eficazes.

Como escrever cartas comerciais,

cartas de desculpas,

de amor,

de despedida.

Como se portar em lugares públicos, cerimônias?

Quantos gramas de carne por convidado?

Até que idade eu visto isso,

se tenho mais de 25 qual o renew indicado?

O meu cabelo preto ainda me cai bem?

Dizem que é uma cor pesada...

Quais os filmes que ganharam Oscar?

os ícones, os discos, as bandas?

Quantas vezes praticar sexo por semana, para ser considerado um ser humano de libido normal?

Enxoval para morar sozinha.

Como lavar a roupa branca,

a colorida,

a fina,

a seda,

as calcinhas.

Acho que eu concluí que não quero estar na média. Que enfim não importa se eu caibo, sirvo ou se estou no caminho considerado certo.

Eu não perdi meus desejos, mas agora sei as minhas prioridades. Se eu cheguei até aqui, não tem tanta coisa errada.

Acho que as listas para coisas a fazer até os trinta só servem para quem não chegou nessa etapa. Quando chega esse momento, você realmente não precisa dessas coordenadas. Ser feliz é uma missão absolutamente pessoal e é sempre da intuição, a última palavra.

A vida não tem um roteiro determinado e o que é bom pra mim, pra você pode ser uma grande furada.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Parabéns, Bi























Hoje é aniversário de uma amiga querida. Lembro com saudade de quando convivíamos na faculdade, no velho posto de gasolina, dentro do carro, salas de aula, corredores. Era maravilhoso saber que toda noite nos encontraríamos, beberíamos, falaríamos sobre a vida, sobre nossos medos, nossas paranóias. Essa certeza funcionava como uma espécie de colo. E assim foi durante anos. Sempre eu, Bi e Ná.

Bi, lembra do último semestre meu na faculdade? Eram quintas e sextas naquele laboratório de Macs pavoroso. Tudo tão branco, e a gente não parava de falar...e mesmo podre de cansadas, ás vezes rolava uma gelada e mais conversa. Não podemos esquecer quando eu finalmente me matriculei em estatística e, desesperada, no meio das latinhas de Itaipava e coca zero, te pedia explicações. E você as dava... Desculpe pelo caderno, que devolvi com cheiro de xixi da saudosa Aimé. (ahahahahahah)
Quantas vezes te levei em casa e ficava na sua porta, parada, falando da vida e você me ouvia. Conselhos, trocas, confidências. Obrigada por isso.

E o dia que meu carro parou em plena 7 de abril pois eu não havia desativado o alarme, e o sistema bloqueou a gasolina? No boteco ao lado, o Victor ria.

São mil lembranças maravilhosas.

Bi sempre foi linda, uma espécie de Brigitte Bardot estressada, despojada.

Agora tem o Bernardo, o filhote mais amado e quem sabe se eu arrumar um bebê bem rápido, eles não brincam juntos um bocado? Seja lá como for a vida, o que eu desejo é que você brilhe, como deve ser pra todo mundo, mas especialmente uma leonina de coração tão puro. Estarei sempre ao teu alcance. É verdade.

Só posso desejar mais um aniversário lindo e que possamos ainda, mesmo que pouco, estarmos juntas, porque é sempre maravilhoso quando nos encontramos e nos damos esse tempo.

Ainda bem que tem o aniversário do barba - evento já incorporado em nosso calendário anual. Pelo menos nessa data, a gente sempre tira a barriga da miséria da saudade.

Te amo, nunca esqueça.

Feliz aniversário!

Barbarela.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Viver para que haja arte

No fundo toda pessoa criativa está em busca de inspiração. Mesmo quando certas situações pareçam ser tão pessoais, o que se busca é um novo tema, uma nova música, um novo poema. Pode parecer loucura o que estou dizendo, mas acredito que está tudo intrinsecamente interligado e num nível inconsciente.

Ás vezes o sol não é tão amarelo, nem tão quente, mas para quê uma poesia, uma tela, um conto morno? Daí se explica certos exageros.

A vida é superdimensionada, e com ela todos os personagens transeuntes. Sendo tudo tão grande, a dor e a alegria também não serão mais ou menos.

Não é fácil conviver com os superlativos. Tudo assim em demasia, nos torna quase sempre cansados ou famintos. E haja paciência com tanto drama, com o excesso de alegria.

A mistura é tão complicada que a busca por preencher uma nova página, se funde com a própria alegria. É como se a nossa criação refletisse nossa vida. Transborda verdade, mentira, sonho, mas, sobretudo aquilo que necessita de forma. Muitas vezes esse resultado cria vida própria e diversos significados perante outros olhos e ouvidos.

É certo que mesmo quando se chora, é bom contar uma história e isso nos obriga a viver. Não tem jeito, mesmo quando soa fictício, o que a gente mostra é sempre reflexo de desdobramentos cotidianos. O que se inventa, parte de um sonho ou de uma possibilidade, do que se nega ou teme mas é sempre tudo o que lateja, tudo o que não cabe. Não dá pra ser então, metade.

Posso falar por mim ou por alguém. Ser expectadora, conhecer outros mundos, outras cores, apenas seguindo passos alheios Ás vezes somos pintores passivos, mas isso também diminui o egocentrismo e aumenta nossas possibilidades.

Seguindo assim a vida se confunde com a arte e a dor ou alegria vira verso, tinta, tom. É uma alquimia que tem a esperança de brilhar mesmo quando o real é chumbo ou de escurecer, ainda que a vida esteja sorrindo.

sábado, 15 de agosto de 2009

Equivocada

Eu sou tímida, enrubesço à bessa, à toa.

Dou bom dia, boa tarde, peço licença e desculpas quando erro.

Quando à vontade, conto piadas, casos, encho o saco.

Azucrino meus amigos, implico, brinco, descontraio.

Levo todo mundo a sério, quando não levo pra casa.

É um paradoxo ser impulsiva frente ao fato de ser contida em tanto.

Devo ser do time dos apostadores de plantão. Vivo repondo as fichas.

Sou também distraída, ando rápido, não vejo os conhecidos na rua.

Acredito piamente no que me dizem. Se depois descubro a mentira, é sempre um desalento.

Sou simples depois do meio dia. Sou complexa quando há tempo.

Não falo para muitos, prefiro aos pares. Sou tímida, repito, mas vergonha é outra coisa.

Equivocada, eu achava que o pior era me apresentar.

Chegar em casas estranhas, cheias de gente.

Começar a dançar quando ninguém ainda ousava.

Mostrar uma idéia sem ter a mínima noção ser ela interessante,válida.

Era conter a decepção ao abrir um presente frustrante.

A primeira reunião com um cliente importante.

Esquecer o aniversário de um amigo, a carteira em casa, o absorvente em cima da mesa.

Colocar um biquini depois de longo inverno.

Ser surpreendida pelo comentário cruel de uma criança.

Escorregar no centro da cidade.

Cair no meio das bostas de gado, entrando pelos fundos para não pagar entrada ( já aconteceu comigo mesmo!)

Era esquecer de pagar o lanche,

a hora do parabéns pra você,

de escolher o primeiro pedaço de bolo,

a primeira transa,

mostrar os peitos,

comprar camisinha, etc

Que nada! Eu estava enganada!

Vergonha mesmo é responder uma mensagem errada.

É perceber que estava numa linha cruzada.

É participar de um diálogo por tabela e só no dia seguinte receber a porrada.

É ter que seguir com essa no salto.

Sabe aquele tchauzinho que você corresponde, mas era para a menina do lado?

É tipo isso, só que elevado ao quadrado.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Bendito Prosecco

Tem dias que são ingratos. Dias que levamos com a barriga, com a sorte ou com a falta dela.

E-m-p-u-r-r-a-m-o-s. São os mais longos, que ironia. Dias que são só noite, sem companhia.

Se havia sol ou chuva, nem se via. Turvo eu diria...se alguém me perguntasse.

Ouso dizer que ninguém quer saber ou ler o que aflige. Falemos da gripe suína, da falta de grana, do desemprego. Merdas um pouco abstratas. Especulemos sobre a fome do mundo, a indecência do senado. Silêncio para nossas dores. Melhor gripado que mal amado. Melhor quebrado do que só.

As verdadeiras feridas são muito feias, fedem. E quem há de confessá-las gratuitamente? Se pelo menos recebêssemos um prêmio, uma estrelinha...melhor maquiá-las.

Ingratos os dias que nos forçam a vista, nos tiram a máscara e corremos pra casa. Enclausurados nós. Imersa na dor, oferto aplausos para os que tem medo e não se machucam. Ótimo, amanhã contarei histórias, eles dormirão o dia inteiro, entediados. Sem enredo, só frustração. Mas bem que hoje eu queria ser o super homem...voar em velocidade estonteante e voltar o tempo. Fazer coisas diferentes. Zerar os erros, alterar o destino. Eis que sou de carne, osso e amor.

E eu o avesso desse medo? E eu que amo tanto? E eu que tou sofrendo?

Ah, tem Caetano, Chico, Freud, Monet. Tem os livros, o cristo, os arcos, os bares. Tem Paris, Cabo Frio, churrasquinho. Benção de Santo Antônio e cheiro de chuva. Pai e mãe ali pertinho. Tem Carlos Drummond, Sabino, Quintana. Tem Woody Allen, aleluia! Almodóvar, Zé do caixão e Noel Rosa. Maiakovski, Dr. Sérgio e Cartola. Lenine, Baleiro e Frajola. Rei leão, Anna Clara, Piaf! Aznavour e Santiago. Blues, jazz e Dr. Jivago. Linda Bardot, orla Bardot e falando em Bardot, todos os gatos. Fotografia, bossa nova e humor. Ironia refinada, Jung e a molecada jogando bola no campinho. Tem cerveja gelada,, batata frita, sertralina. Perfume francês, Depardieu, Jabor, jabuticabas. Marlboro, rock`n roll, palavras cruzadas. Olhos e ouvidos para tudo isso. E se hoje eu ainda escrevi esse texto, viva o prosecco!

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Permito-me pausar

O estranho é quando se instala esse nada.

Não há raiva, dor ou alegria. Só silêncio e preguiça.

Sono da vida, de toda gente, do burburinho.

Vontade de zero. Férias dos desejos. Será medo?

Quase calmaria e menos que tédio. Esse ponto por um triz me incomoda porque não sei se antecede a um terremoto, uma bomba ou se é só esgotamento.

Esse contentamento sem graça é meio oco. Incolor e vazio.

E eu que preciso tanto das formas, frases e palpites. Eu que anseio, vibro, grito. Eu e meus textos sobre isso, sobre aquilo. Hoje falta mas não dói. E nem a pontada do desapontamento se acusa e muito menos o afã de uma idéia nem tão nova, mas pulsante.

Pensando bem se fosse nada nem estranho me pareceria. É só uma dormência, uma pausa, um freio que me visita e eu gosto, mas receio, afinal sou gata escaldada de certas dores, certas pelejas. Tenho a mania quase obsessiva do autoconhecimento, de me perceber a todo momento. Nem isso hoje. Descanso de Freud e lucidez.

Permito, preciso e quero hoje essa estupidez da quase alienação de não se saber ou querer absolutamente nada. Só meu gatos, que a essa altura deitam no teclado, enciumados. Convite irresistível a um breve descanso do mundo.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Interrompidos

O coração numa bandeja, exposto

O corpo sem pano,

revelado, aberto, óbvio

A boca muda de medo

O verbo escrito todo em exagero

Superlativos imorais.

Variados apelos,

apreço demais.

Eis que nada se viu

Pouco se soube

E quem é que se deu por satisfeito?